31.3.10

Rio & Geografia: Os ônibus (parte 2/5)





Os cariocas têm uma grande afeição às linhas de ônibus. Isto é, refiro-me àqueles que usam tal meio de transporte, pois nem todos o utilizam. Mesmo assim, independente da condição social ou do lugar onde mora, todos pegam ou alguma vez subiram em algum coletivo. Ainda assim, mesmo quem nunca tenha pego – o que eu acho difícil! -, conhecê-los de vista, pela cor, pelo número, todo mundo conhece, o que comprova que os ônibus são figuras bastante marcadas na cidade. Uma relação de amor platônico, que deriva em nomeações criativas como “quatro doidão” (referência à linha 422, na foto acima), “laranjinha”, “amarelinho” ou, então, em divergências na leitura dos números: o 247 pode ser chamado de “dois-quatro-sete”, enquanto outros chamarão de “duzentos e quarenta e sete”. O cara que faz uso da primeira nomenclatura fará cara feia ao ouvir o soar da segunda e vice-versa. Os ônibus são figuras carioquíssimas - repito -, é parte do nosso cotidiano, mesmo que não percebamos.

No entanto, os ônibus do Rio encontram-se em uma linha tênue entre o amor e o ódio. A dificuldade de locomoção em uma cidade cercada de morros, com vias bastante deficientes acoplada aos interesses da esfera privada, faz com que o carioca sofra com os itinerários pouco eficazes. Itinerários repetitivos, que sobrecarregam as ruas e avenidas. Sem falar no monopólio das empresas que dominam determinadas áreas do Rio, prestando serviços aquém do exigido, tarifas exorbitantes e – uma vez mais – com itinerários ultra semelhantes.

Enumerei alguns exemplos em diferentes regiões da cidade. Acompanhe.

CENTRO
A área mais bem servida de linhas de ônibus. Motivos são óbvios: é o Centro da cidade. Dali se encontram linhas para todos os lugares do Rio, embora o excesso no número de veículos sobrecarregue de forma decisiva todas as ruas desta região, cujas quais a maioria não conta com largura adequada para o recebimento de um grande fluxo de veículos. Logo, os dois grandes eixos viários do Centro (as avenidas Presidente Vargas e Rio Branco) viram um mar de ônibus nos quais, muitas das vezes, estão vazios. Quantidade de linhas, no Rio, é um sinônimo de qualidade, de serviço bem prestado, o que em realidade isso não consta nem um pouco. Redução no número de linhas com aumento de planejamento nos itinerários amenizaria o problema do trânsito no Centro – junto da expansão do metrô, o que é assunto para outro post.


A CENTRAL DO Brasil, na Avenida Presidente Vargas: um número alto de coletivos circula por esta via, que é uma das mais largas da cidade do Rio, com quatro pistas. Mesmo assim, o trânsito é caótico.


ZONA SUL
A área turística da cidade, a Zona Sul, conta com os melhores serviços de transporte da cidade, além do Centro, com ônibus modernos, limpos e menos poluentes, em alguns casos. Entretanto, o que a Zona Sul ganha em conforto, ela ganha em trânsito caótico e em excesso de linhas. Nesta região, encontram-se três grupos de itinerários circulantes: Zona Sul-Zona Sul (linhas que circulam entre os bairros da Zona Sul, administrada em maior parte pela empresa São Silvestre), Zona Sul-Centro (linhas que ligam os bairros desta zona ao Centro da cidade, na qual a Real Auto Ônibus tem o poder quase supremo sobre este trajeto) e Zona Sul-Zona Norte (linhas que ligam os bairros do Sul aos da Zona Norte, mais especificamente à região da Tijuca e de Vila Isabel e algumas poucas linhas que conectam ao subúrbio). A ligação entre as zonas Sul e Oeste é ainda precária, com exceção dos bairros da Barra e do Recreio.


A FALTA DE planejamentos nos itinerários, de forma a torná-los mais eficazes, ficam em segundo plano, contribuindo para o excesso de frota nas ruas e, na maior parte das vezes, sem passageiros, pois os itinerários são muito mal distribuídos. Na foto acima, a Avenida das Nações Unidas, em Botafogo, após uma batida de ônibus, em janeiro de 2010.


Espremida entre o mar e a montanha, a Zona Sul não conta com avenidas largas o suficiente para receber a quantidade de veículos que recebe. Os itinerários fazem o mesmo percurso praticamente, afinal, os acessos para sair da Zona Sul são poucos. Uma mesma linha que ligue o bairro do Leblon ao da Glória pode ser o mesmo que ligue o Leblon ao Centro, ou então, até mesmo, um que conecte o mesmo bairro à Zona Norte. Ainda no mesmo raciocínio, uma mesma linha de ônibus que ligue, por exemplo, Copacabana à Central do Brasil, pode ser feita por outras diversas linhas que ligam Copacabana à Zona Norte, via Avenida Presidente Vargas.

TIJUCA e ALTO DA BOA VISTA
Outra região bastante próxima do Centro que é muito bem servida de ônibus. Ainda que a malha de ruas/avenidas desta localidade seja mais expandida que a da Zona Sul, o trânsito caótico também impera nas principais vias de trânsito, como a Praça Saens Peña, ponto de partida de diversos coletivos para diferentes regiões da cidade. Uma das críticas ao sistema de ônibus da Tijuca é a semelhança entre os itinerários que conectam esta região à Zona Sul. Uma linha que conecte a Tijuca ao Leblon, por exemplo, percorre todo o Centro da cidade, Aterro do Flamengo, Copacabana e Ipanema. Uma linha que ligue a Tijuca à Gávea, percorre a Lapa, toda a Praia do Flamengo, Botafogo, Humaitá, Jardim Botânico e... ufa!, a Gávea. O Túnel Rebouças, principal eixo viário entre as zonas Sul e Norte, encontra-se em um bairro vizinho à Tijuca, podendo interligar tais trajetos em questão de minutos. Entretanto, não existe nenhuma linha regular que percorra toda a Rua Conde de Bonfim em direção à Zona Sul via Rebouças, que é logo ao lado.


A AUTO VIAÇÃO TIJUCA, mais conhecida como Tijuquinha, monopoliza as linhas de ônibus que circulam pelas estradas do Alto da Boa Vista, com serviços nem sempre satisfatórios. A frequência irregular das linhas deixa muitos moradores da Tijuca e do Alto na mão, pois são as únicas que conectam a região à Barra da Tijuca.


Em seguida, o problema dos ônibus no Grande Méier, Barra e Recreio, Jacarepaguá, Ilha do Governador, Subúrbio e Zona Oeste.

Fontes das fotos, por ordem de aparição:
1 - Disponível em Busologia do Rio. Acesso em 31/03/10, às 14h40.
2- Disponível em Extra. Acesso em 31/03/10, às 14h28.
3 - Disponível em O Dia. Acesso em 31/03/10, às 14h19.
4 - Disponível em Revista do Ônibus. Acesso em 31/03/10, às 14h50.

9 comentários:

Samila Soares disse...

Pedro,
Como o serviço do Tijuquinha é ruim!!! Os motoristas parecem uns loucos e os ônibus estão quase desmontando...não é mole!!

Paulo Lescaut disse...

Pedro Paulo, adorei seu blog. Você podia entrar pro SSC:

http://www.skyscrapercity.com/forumdisplay.php?f=272

Lá nós fazemos justamente tópicos com fotos de ruas de cidades do Brasil e do mundo. :)

nuno graça disse...

A Alpha tentou recentemente colocar uma variante da 415 via Rebouças, em termos de passageiro deu certo, mas as outras empresas caíram em cima dela, e ela teve que suspendê-la em menos de uma semana de operação.
A única linha Tijuca-Zona Sul que tem uma variante regular via Rebouças é o 409, mas que só vai até o Jardim Botânico, se fosse até o Leblon ajudaria mais. Já da Vila Isabel há as variantes da 434 e 438 via Rebouças, e a última conseguiu ser mais lucrativa que a linha original, via Praça 15.
Só espero que, com a confirmação das obras da Estação Uruguai e da chegada da linha 1 do Metrô à Gávea possa ser realizado o antigo projeto de tornar a Linha 1 circular com o túnel sob o maciço da Tijuca. Seria bom para o trânsito da Tijuca e do Túnel Rebouças, e ao mesmo tempo um baque grande nas empresas de ônibus.
A Tijuquinha melhorou a operação no Alto, mas comete um erro grotesco: Ela limita os giros dos motores dos ônibus a 1800 RPM nas linhas do Alto, ou seja, parece todo o tempo que o carro vai morrer, os motoristas mal chegam a passar a 3ª marcha...

Ivo Korytowski disse...

Nossos ônibus são lindos, mas as linhas não seguem uma boa lógica e se sobrepõem. Outra característica que distingue nossos ônibus daqueles de outras cidades brasileiras e mundiais é o nervosismo da direção, as arrancadas e freadas bruscas. Já foi muito pior, acredito que os motoristas atuais passem por um treinamento de boa direção mas... estamos longe da calma búdica de um motorista de ônibus digamos de Amsterdam ou Munique!

Pedro Paulo Bastos disse...

Nuno: quando foi que aconteceu isso do 415 funcionar uma linha pelo Rebouças? Tem muito tempo? Se a Alpha disponibilizasse uma linha fazendo esse percurso, seria ótimo. Assim como a Transurb, se pudesse transformar também o 410 em Rebouças; você vê - o 409 e o 410 possuem, praticamente, o mesmo trajeto. A diferença é que o 410 vai até à PUC e o 409 até o Horto. O 409 disponibiliza a versão Rebouças nos dias úteis. Seria muito mais interessante se o 410 tivesse essa versão, porque ele faria todo o percurso do 409 e mais um pequeno pedaço até à Gávea. Ir da Tijuca pra Gávea, de ônibus, é sofrível, se não for pelo Rebouças. Haja paciência!

Ivo: A forma de como conduzir os veículos aqui no Rio dos motoristas de ônibus nada mais é do que um retrato do próprio comportamento do brasileiro - na verdade, eu diria do carioca: apressadinho, mal educado, sem limites. Grande parte dos cariocas ainda é muito ignorante.

Cris Chagas disse...

Eu trabalhei 2 anos no Alto da Boa Vista e sofri muito com a Tijuquinha. O serviço é terrível!
bj

nuno graça disse...

Pedro, foi em Janeiro quando a Alpha testou a 415 Rebouças nos dias úteis no horário de pico, e um conhecido meu falou que a linha chegou a dar mais de 50 pagantes por viagem, e isso na semana de estréia.
A empresa foi forçada a suspendê-la, sob alegação de que estava "roubando" passageiros de outras empresas. Nessa guerra das empresas de ônibus, quem perde é o passageiro, como sempre.
Tomara que o projeto da linha 1 circular sob a Serra da Carioca se concretize, mesmo que a longo prazo.

alice disse...

só tenho q discordar da alegação de que ônibus em excesso prejudica a zona sul... pode até atrasar playboy que anda de carro o tempo todo (deviam ser apresentados a essa foto http://blig.ig.com.br/freeride/files/2008/12/poster_munster.jpg ), mas pra quem depende de ônibus é ótimo!

eu já tive que trabalhar em diferentes pontos do centro da cidade e acho ótimo poder escolher entre as várias linhas a que mais próximo me deixa (desce pelo aterro ou pela praia? entra na presidente antonio carlos ou na méxico ou pega o mergulhão? etc...)

fora que é ótimo ter sempre lugar pra sentar e não ser obrigada a esperar horas no ponto

Pedro Paulo Bastos disse...

Alice,
é realmente bastante confortável você ter opções como essas, mas será que compensa? Eu acredito que não. É uma satisfação muito mais individual do que coletiva. Sim, você vai sentada no ônibus, mas de que adianta ir sentada se você vai pegar engarrafamentos quilométricos por causa de vários ônibus vazios - e de percursos quase iguais - transitando na mesma rua?
Vide a Av. Copacabana. São dezenas de ônibus pro Centro, sendo que são outras dezenas de ônibus que vão para a Zona Norte e que passam pelo Centro. É sofrível ir do Posto 6 até o Lido - fica tudo congestionado.