30.10.09

O oásis do Engenho de Dentro


IMAGEM DE SATÉLITE do local fotografado, com o local pintado em verde, no bairro do Engenho de Dentro: observe que a região é composta, majoritariamente, por casas.


O post de hoje é bastante especial pois, pela primeira vez, trago fotos de uma região da Zona Norte cuja qual ainda não havia publicado: o subúrbio. Para inaugurar esta seção, eu percorri duas praças e as ruas adjacentes de uma área muito simpática do bairro do Engenho de Dentro, na terça-feira passada. Em detalhes, os protagonistas da matéria de hoje são as praças Amambaí (foto ao lado) e Itapevi, e as ruas que as conectam, Alberto Leite e Itapema, que ficam ali perto do Largo da Chave de Ouro e do pólo comercial da Rua Dias da Cruz. Se você nunca andou por dentro do emaranhado de ruas do bairro do Engenhão, não perca a oportunidade de conhecê-lo, em parte, aqui n'As Ruas do Rio!

Primeiro de tudo, vale lembrar que o Engenho de Dentro é o típico bairro suburbano: uma estação de trem com vias expressas estreitas (foto ao lado), imóveis antigos – entre eles, sobrados e casas, muitas casas! –, e um certo ar de decadência, fruto da ausência de novos investimentos. Porém, diferentemente de muitas áreas do subúrbio carioca, onde a paisagem é, em geral, muito degradada e abandonada, esta partezinha do Engenho de Dentro foge à regra, e mostra-se resistente, apesar dos pesares.


O PANORAMA da Praça Amambaí e o seu entorno, composto por belas casas: endereço tradicional na região do Grande Méier.


Eu iniciei o meu percurso a partir da Praça Amambaí, localizada em uma quadra entre as ruas Hugo Bezerra e Alberto Leite. De tamanho médio e aconchegante, a praça é bem conservada, tem playground, jardins e mesas, onde muitos vovôs passam as manhãs no jogo de cartas (foto ao lado). Sem falar na arborização em abundância! Uma área de lazer valiosíssima, que dá prazer em saber que existe e que continua dentro dos padrões normais de funcionalidade. Fiquei feliz, afinal, é raro, hoje em dia, ver uma praça bem-cuidada fora do eixo Zona Sul – Barra. Ponto para o Engenho de Dentro!


O LOCAL É utilizado, principalmente, por crianças e pessoas da terceira idade. À noite, a praça vira área de ginástica, onde muitas pessoas praticam o jogging no seu entorno.



TANTO NA PRAÇA como nas ruas adjacentes, as casas são espaçosas e de poucos pavimentos. Um detalhe peculiar é a figura de santos religiosos no topo das fachadas.


As casas no entorno da Praça Amambaí e ao longo da Rua Alberto Leite (fotos ao lado) são construções dos tempos áureos do subúrbio: casas amplas, varandas enormes, muros baixos, arquitetura exclusiva e, na grande maioria delas, a figura de algum santo religioso no topo da fachada. Embora se note um ar de decadência, os imóveis possuem todo um glamour, resquícios do passado, construídos pela classe média alta que ali morou – e que ainda mora! Dentre essa classe média, muitos profissionais liberais, que até hoje mantêm nos seus portões pequenas placas com o nome do próprio e a sua formação e especialidade. Aliás, essa característica é muito peculiar à esta região e às adjacentes, como o bairro do Méier, por exemplo.


AS CASAS DA RUA Alberto Leite nos remete aos tempos áureos vividos pelo subúrbio, com suas construções imponentes e amplas. Nos dias de hoje, o charme de algumas casas ainda estão preservados, embora se note um toque de decadência na manutenção de outras.



ÁRVORES COINCIDENTEMENTE padronizadas na Rua Alberto Leite valorizam o aspecto das calçadas, em meio aos canteiros de plantas e flores. A área, por ser tranqüila, possui redutores de velocidade (os famosos quebra-molas).


A amplitude das calçadas e da via também chama a atenção: ambas são suficientemente espaçosas, o que nos mostra o reflexo de um projeto de urbanismo bem-sucedido. As árvores têm estruturas parecidas, constituindo um aspecto padronizado à Rua Alberto Leite, e estão separadas por distâncias iguais. Entre uma ou outra, alguns arbustinhos e canteiros de plantas e flores, que fazem toda a diferença na avaliação da paisagem. Agora o mais charmoso de tudo são as cestinhas de ferro fincadas na frente de cada casa (exemplo na foto à esquerda); ao invés das sacas de lixo ficarem espalhadas pela calçada, a cesta de ferro as abriga, proporcionando um visual mais clean à rua – literalmente!


AS PROXIMIDADES das esquinas da Rua Alberto Leite com a Rua Itapema.


A esquina da Alberto Leite com a Rua Itapema é outro cantinho simpático, com os pequenos arbustinhos em canteiros de cimento subindo a ladeirinha que constitui a parte mais elevada deste trecho da Itapema (foto ao lado). Aliás, ali as casas são mais altas, devido ao relevo, mas continuam imponentes, e o que eram raros, até então, começam a aparecer: edifícios!, logo ali, pela esquina com a Rua Jurunas, de cara com a Praça Itapevi.


OS IMÓVEIS NA RUA Itapema são mais verticalizados e com escadas, devido à elevação do relevo neste trecho da via.



ATÉ ENTÃO RARO, um edifício com mais de cinco pavimentos aparece na esquina da Rua Itapema com Jurunas. Ao lado, o panorama da Itapema, com suas casas e a ladeirinha: ruazinha simpática.



A CHEGADA À PRAÇA Itapevi através da subida pela Rua Itapema.


A Praça Itapevi se situa em um recuo bem no encontro das ruas Jurunas e Itapema, e o seu entorno é composto também por casas e alguns poucos prédios. Menos arborizada que a Praça Amambaí, o playground está em ótimo estado de conservação (viva!), assim como os canteiros bem-cuidados e pintados, sem nenhum tipo de pichação. Coisa rara! Agora o que não é nada raro por ali são os postes com luz acesa em plena manhã (foto ao lado). Não só no Engenho de Dentro, mas como em muitos outros lugares do Rio, inclusive no Leblon, local onde eu cheguei a fazer um comentário sobre o poste aceso da Rua Carlos Góis, no post do dia 8 de Agosto de 2009. São cenas lamentáveis...


A CASA AMARELA da Praça Itapevi e um terreno baldio, cercado por muro grafitado com a bandeira do Brasil: pinturas relacionadas aos jogos de Copa do Mundo no chão e nas paredes das ruas são particularidades do subúrbio.


O grande barato mesmo em relação ao local percorrido do post de hoje é o de observar a forma como se dispõem os elementos urbanos no espaço. Quem está acostumado a percorrer áreas extremamente adensadas, nota que no Engenho de Dentro os terrenos de cada casa são bastante espaçosos e amplos. Diferentemente de lugares como a Zona Sul, por exemplo, onde em uma rua existem centenas de portarias uma ao lado da outra, em terrenos não tão largos, o subúrbio tem de bom essa coisa da qualidade do viver bem, em um espaço suficientemente satisfatório para as necessidades físicas de cada indivíduo. Isso pôde ser comprovado pelas casas fotografadas – elas são megaconfortáveis. E charmosas. Assim como as ruas, calminhas e aprazíveis. Um oásis em pleno Engenho de Dentro.


FINAL DO PERCURSO: vista de parte da Praça Itapevi e a descida da Rua Itapema sob a perspectiva da Rua Jurunas.


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24.10.09

"Caminito" carioca ou rua dos abricós-de-macaco?


A ENTRADA da Rua Visconde de Caravelas pela Rua Real Grandeza, no bairro de Botafogo. As casas coloridas, como as da fotografia, nos remetem à região do Caminito, na capital argentina.

O tempo no Rio anda tão estranho que chega a ser difícil definir em que estação estamos, se sentimos calor ou não, se sentimos frio ou não. Um dia, chuva; no outro, o sol aparece e dá alegria aos praieiros, que se desanimam rapidamente ao notar que o céu, mais uma vez, se acinzentou, enquanto o Cristo tenta se dar por percebido em meio as nuvens que o cobrem. Assim tem sido nos últimos meses, e não foi diferente ontem, quinta-feira, quando eu fui para a Rua Visconde de Caravelas, na Zona Sul, trazer as fotos para o post de hoje. Com guarda-chuva na mão e a máquina em outra, eu percorri toda essa arborizada rua, que começa no burburinho da Rua Real Grandeza, em Botafogo, e termina lá nos fundos da Casa de Saúde São José, já no bairro do Humaitá. Preparado? Então acompanhe-me!


REPRESENTAÇÃO cartográfica da Rua Visconde de Caravelas e o seu entorno.*


Já na entrada da Visconde de Caravelas, na sua ponta em Botafogo, pode-se notar, de cara, a arquitetura predominante da via, formada por muitos sobrados e casas. Em geral, esses sobrados centenários, hoje, estão ocupados por estabelecimentos comerciais e suas fachadas pintadas por cores fortes e vivas, muito semelhantes àquelas do Caminito, em Buenos Aires. Exemplos desses, no início da rua, é a filial da farmácia de homeopatia Caminhoá (foto ao lado), ocupada em uma casa antiga, em azul-ciano, e o bistrô e café Creme Caramelo, em um sobrado de cor grená, com detalhes em branco. Um toque simples e sofisticado, que revigora o fôlego destes imóveis, cada vez mais ofuscados pela arquitetura moderna, com seus edifícios gigantes e espelhados.


OS SOBRADOS e casas da Visconde de Caravelas e as diferentes tonalidades que dão vida às fachadas.



VILAS e casas charmosas fazem parte da rua, em toda a sua extensão.


E os abricós-de-macaco? Para quem não sabe, os abricós-de-macaco são um tipo de árvore bastante chamativas pela sua floração, que dão diretamente nos troncos (foto ao lado). São flores vermelhinhas, ou rosas, bem iguais àquelas de desenho animado, com pétalas bem definidas e desenhadas em torno de uma cápsula globosa (ou cannon ball tree, de acordo com o Jardineiro.net). A flor do abricó é bonita, porém ordinária: quando apodrecidas, exalam um odor não muito agradável, e suas sementes podem chegar a pesar até 3 quilos, prejudicando o capô de muitos carros estacionados na via quando em queda. Essa árvore está disposta em todo o percurso da rua, disputando com as cores vivas dos sobrados e casas qual dos dois mais simboliza a identidade da Visconde de Caravelas.


A CALÇADA pintada com o jogo da amarelinha fica bem na porta do Centro Educacional Acalanto, voltada para o ensino infantil.


Seria injusto falar somente das casas na Rua Visconde de Caravelas; os edifícios também estão presentes por ali - alguns antigos bonitinhos (foto à esquerda), outros mais simples e, claro, aqueles mais modernosos, com varandas e jardins amplos. A grande verdade é que a rua, apesar da sua aparente calmaria e baixo tráfego de automóveis, engana e muito em relação ao seu caráter: residencial ou comercial? Um misto. De tudo um pouco tem por ali: colégios, como o Centro Educacional Acalanto (fotos acima) – voltada para o ensino infantil, em uma casa antiga de rosa impecável e calçada de amarelinha – e a escola-americana Our Lady Of Mercy School; clínicas odontológicas, e uma casa de festas, a Caravelas Eventos. Entretanto, o grande atrativo comercial é a gastronomia. Mas isso é tema para outro parágrafo!


MAIS DOS estilos de casas e edifícios que existem na Rua Visconde de Caravelas.


A Rua Visconde de Caravelas (junto da Rua Conde de Irajá, que a corta) foi designada como Pólo Gastronômico de Botafogo pois ali se concentram alguns dos principais restaurantes novos e badaladíssimos da Zona Sul, que a toda hora pipocam nas colunas sociais e de crítica. É ali onde estão, além do já citado Creme Caramelo, o restaurante e pizzaria Espaço da Gula; o I Piatti, especializado na cozinha japonesa (foto ao lado), e o Bar do Belmiro, o típico pé-sujo não tão sujo assim, famoso pela sua feijoada e pelas comidas de botequim. Todos esses estão ocupados em casas antigas da rua, ali pelo cruzamento com a Rua Conde de Irajá, junto de outras casas residenciais também bastante charmosas.


PANORAMA do cruzamento da Visconde de Caravelas com a Rua Conde de Irajá, com o Bar do Belmiro em destaque.


A PLACA DO Pólo Gastronômico de Botafogo na esquina com a Rua Conde de Irajá. Dali em diante, a Visconde de Caravelas passa a pertencer ao bairro do Humaitá.


O TRECHO entre as ruas Conde de Irajá e Capitão Salomão: tronco florido pela flor do abricó-de-macaco; o panorama da Rua Visconde de Caravelas, e, ao lado, a visão do Corcovado e do Cristo Redentor.


Após a Conde de Irajá, a Rua Visconde de Caravelas passa a pertencer ao bairro do Humaitá. Neste trecho, as casas e sobrados são menores e menos arrumadas e estão entre alguns prédios altos e pomposos. Entretanto, é novamente no cruzamento, agora com a Rua Capitão Salomão, onde estão outras referências gastronômicas da região: por ordem, a Eccellenza Pizzaria, sofisticada, no seu sobrado cor de abóbora com tijolos; uma filial do botequim Informal, já comentado aqui n’As Ruas do Rio; os restaurantes Caravela do Visconde e o Aurora (à esquerda), um do ladinho do outro, e o bar Plebeu (à direita), já na outra calçada, badaladíssimo, instalado em uma casa de cor amarelo-ovo de bastante imponência. Adianto-me a dizer que lá mais para o final estão outros dois restaurantes queridinhos do circuito gastronômico: o No Mangue - Frutos do Mar e o Botequim, em imóveis, óbvios, pouco discretos. Antes de seguir, peço perdão se fui cansativo enumerando a todos os estabelecimentos da Visconde – a questão é que eles são a alma desta região, e seria injusto não citá-los um por um... O estômago agradece!


O CRUZAMENTO da Visconde com a Rua Capitão Salomão, com destaque para o Botequim Informal, na primeira foto.



A RAÍZ DE UMAS das árvores da Visconde emerge, e as pedras portuguesas se descolam; mais uma da série de casas charmosas; e os restaurantes No Mangue e Botequim.


A VISCONDE DE Caravelas é sem saída. As imagens correspondem ao seu final: à esquerda, a foto registra a entrada de funcionários da Casa de Saúde São José; à direita, prédios, e o Cristo, escondido.

O trecho final da Rua Visconde de Caravelas corresponde à quadra que compreende as ruas Capitão Salomão e General Dionísio. A partir desta última, a Visconde de Caravelas passa a ser sem saída. Bom ou ruim? Acho que bom! Não sei como anda a segurança nessa área; só o que posso afirmar é que o trecho da via que corresponde ao Humaitá é mais elitizado e ainda mais arborizado. As casas, no entanto, continuam bonitas e bem-cuidadas (na foto ao lado, a casa corresponde à Associação das Antigas Alunas de Sion); os sobrados mantêm suas cores vivas e cativantes; as flores dos abricós se intensificam em quantidade mais do que nunca; os edifícios dão o ar de sua graça, ofuscando o clima simpático de subúrbio da área; e o Corcovado e o Cristo Redentor ali próximos, disponível aos olhos a qualquer virada de pescoço. Lugarzinho bom, não?

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* O Carême Bistrô, indicado no mapa do início do post, fechou suas portas em meados do ano de 2009.